sábado, 24 de julho de 2010

OPINIÃO: Justa causa versus razão atendível

Justa causa versus razão atendível, por Claúdia Rebelo.
(Publicado no "JN" de 23/07/201)

A actual discussão em torno de uma hipotética e ampla revisão da Constituição da República Portuguesa (CRP) - seria a oitava desde 1976 - suscita, entre outras, no que concerne à matéria dos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, a substituição do conceito de "justa causa" pela expressão "razão atendível". Ora, em Portugal há justamente 34 anos que a invocação de "justa causa" é - também em virtude do consagrado na Recomendação n.º 119 da Organização Internacional do Trabalho - condição de validade do despedimento na ordem jurídica portuguesa, por força do disposto no art.º 53.º da CRP.

Não obstante, em nome da necessidade de flexibilizar a lei do trabalho, a discussão sobre os limites da noção de justa causa - conceito que a própria CRP não determina - tem vindo a ser, desde então, periodicamente promovida.

Por exemplo, no Acórdão n.º 107/88 do Tribunal Constitucional (TC) discutiu-se o alargamento do conceito de justa causa a situações objectivas que estivessem ligadas ao conceito de inaptidão do trabalhador. E este acórdão afirmou que não cabia na intenção jurídico-normativa da norma constitucional do art.º 53.º da CRP o ressurgimento da figura do motivo atendível que o DL n.º 372-A/75, de 16/07, erigira em causa de despedimento. Posteriormente - aquando da reforma laboral de 1989, concretizada pelo DL nº 64-A/89, de 27/02, que alargou o despedimento por justa causa objectiva (alheia ao exercício do poder disciplinar) à extinção de posto de trabalho e, ainda do DL n.º 400/91, de 16/10, que consagrou o despedimento por inadaptação do trabalhador - também o Acórdão n.º 64/91 do TC sublinhava a necessidade de se evitarem despedimentos arbitrários e judicialmente incontroláveis.

Assim, além de um debate sobre a oportunidade de revisão da CRP, a questão do ressurgimento do conceito de "motivo atendível", pretendendo abranger não só a justa causa objectiva mas também a subjectiva (despedimento disciplinar), exigirá que se assegure uma avaliação do impacto desta medida, não só em nome da tutela da dignidade pessoal no trabalho mas também do princípio da segurança jurídica pois, em contexto de possível agudização dos problemas sociais, importará que se acautelem subjectivismos que poderão ter, a prazo, um impacto muito significativo no, já de si frágil, tecido social português.

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